Durante o Festival das Tochas, milhares de pessoas se reúnem em regiões como a Prefeitura Autônoma da Etnia Yi de Chuxiong e o Condado Autônomo da Etnia Yi de Shilin, na província de Yunnan, para rituais e celebrações animadas com tochas. Esse tradicional festival da etnia Yi, com milênios de história, tornou-se também uma festividade compartilhada por diversos grupos étnicos do sudoeste da China. Mas por que essa celebração perdura até hoje? E como ela se compara, em termos de valores, a outras festas e rituais com fogo ao redor do mundo? O professor Bai Xingfa, da Universidade Minzu de Yunnan, orientador de doutorado, oferece uma análise comparativa.
Segundo Bai Xingfa, o Festival das Tochas, com milênios de história, é um símbolo da cultura da etnia Yi e tem suas raízes no culto primitivo ao fogo praticado pelos antepassados desse povo. A etnia Yi chama o festival de “Grande Ano Novo”. Em regiões como Yunnan e Sichuan, a festividade costuma ocorrer por volta do dia 24 do sexto mês do calendário lunissolar, variando em duração conforme a localidade.
Para a etnia Yi, a tocha afasta desastres e expulsa os males. O fogo é considerado uma força mística capaz de garantir boas colheitas, prosperidade dos rebanhos e proteção contra doenças e pobreza. O festival tem forte caráter ritualístico, com elementos como oferendas ao céu e aos antepassados, cerimônias de invocação e purificação, queima de pragas e orações por fartura.
Tradicionalmente, o festival dura três dias, com atividades principais à noite, como a iluminação das tochas e grandes celebrações em volta de fogueiras com música e dança. Durante o dia, além de lutas tradicionais e touradas, o festival serve de ocasião para encontros sociais, românticos e para o comércio local.
Bai destaca que rituais com fogo também são comuns em países como Índia, Japão e Espanha. Em abril, por exemplo, devotos se reúnem diante do templo Durga, na Índia, para lançar tochas de folhas de palmeira uns nos outros, numa homenagem à deusa guerreira. Nessa cerimônia, dança-se sobre o fogo em oferenda, pedindo proteção contra desastres e bênçãos de fartura. Na Grécia, durante a festa de São Pedro e São Paulo, pessoas vestidas com trajes tradicionais correm e dançam descalças sobre carvões em brasa ao som de tambores e cantos, numa prática de purificação e busca por bênçãos. Já em Fiji, no Pacífico, o costume de “caminhar sobre o fogo” (pedras incandescentes) simboliza coragem e uma conexão espiritual com os ancestrais. A dança no fogo, nestes contextos, representa fé e bravura, assim como o “salto da tocha” observado na etnia Yi, no qual se salta sobre tochas em chamas como símbolo de superação de dificuldades e esperança num futuro melhor.
Para Bai Xingfa, o domínio do fogo foi um marco na evolução da humanidade. O fogo, ao mesmo tempo em que aquece e ilumina, também pode destruir, e por isso é visto como uma força misteriosa e poderosa em todas as culturas. A “cultura do fogo”, enquanto símbolo de luz e calor, possui significados compartilhados entre civilizações.
Ele observa que, enquanto as festividades orientais, como o Festival das Tochas, ressaltam o caráter sagrado e utilitário do fogo, com forte dimensão coletiva e de coesão étnica, os rituais ocidentais tendem a valorizar mais o indivíduo. No Ocidente, o enfrentamento do fogo, como caminhar sobre brasas, é frequentemente guiado por crenças pessoais e pela busca de força interior. Já no Festival das Tochas, o fogo é simultaneamente uma divindade e uma ferramenta do cotidiano, e sua celebração envolve toda a comunidade, refletindo a espiritualidade e o senso de pertencimento coletivo do povo da etnia Yi.