A exposição “Luz do Sol - A Antiga Civilização Shu e o Mundo” foi recentemente inaugurada na sede da ONU em Nova York. Esta é a primeira vez que a antiga civilização Shu, representada pelos sítios arqueológicos de Sanxingdui e Jinsha, é exibida na sede das Nações Unidas. No entanto, não é a primeira ocasião em que o público ocidental tem contato direto com a idade do bronze de Sanxingdui. Há mais de vinte anos, a mostra “Relíquias Milenares – Exposição de Artefatos Arqueológicos da Província de Sichuan, China” percorreu os Estados Unidos e o Canadá, sendo a primeira grande exibição na América do Norte de objetos escavados do sítio de Sanxingdui. O responsável por levar aquela exposição ao continente foi Jay Jie Xu, o então diretor do Museu de Arte Asiática de São Francisco e primeiro curador de origem chinesa a dirigir um grande museu nos EUA. Qual o papel dos museus na troca cultural entre civilizações? E como, em um contexto ocidental, é possível contar bem a história da China por meio da museologia?
Jay Jie Xu aponta que, por muito tempo, estudiosos acreditavam que a idade do bronze na antiga Sichuan teria surgido tardiamente. No entanto, as escavações arqueológicas das fossas sacrificiais 1 e 2 de Sanxingdui, realizadas na década de 1980, mudaram radicalmente essa visão. Segundo ele, a civilização de Sanxingdui, assim como outras grandes civilizações do bronze do mundo, possui um valor histórico e cultural inestimável.
Nenhuma civilização do planeta se desenvolveu de forma isolada, os intercâmbios e o aprendizado mútuo entre culturas sempre ocorreram. Os artefatos de bronze descobertos em Sanxingdui evidenciam essas conexões culturais. Por exemplo, a cerâmica encontrada no local apresenta traços das culturas de Majiayao e Erlitou. Já as lâminas cerimoniais de jade escavadas no Vietnã tem impressionantes semelhanças de material e forma com as lâminas yazhang de Sanxingdui.
Para Jay Jie Xu, as exposições temporárias são formas concretas de promover intercâmbio entre culturas e nações. Embora os museus do Ocidente e do Oriente tenham características distintas, compartilham a missão de preservar o patrimônio cultural e manter viva a memória histórica. Ao levar relíquias e obras de arte a milhares de quilômetros de distância para exibição conjunta, os museus realizam na prática a troca cultural entre civilizações.
Xu enfatiza que, ao planejar um evento cultural, o ponto de partida deve ser o público-alvo.
Para contar bem a história da China em um contexto ocidental, é essencial identificar pontos de conexão entre as culturas do Oriente e do Ocidente e, a partir deles, construir a narrativa. “Nosso museu já realizou uma exposição sobre os soldados de terracota do imperador Qin Shi Huang. Eles são, sem dúvida, impressionantes. Mas o que essa grandiosa obra tem a ver com a vida do público ocidental? Como despertar um entendimento mais profundo? O imperador Qin Shi Huang ordenou a construção dos soldados de terracota como forma de buscar a imortalidade em vida e assegurar que sua presença continuasse sendo sentida após a morte. Ora, pessoas comuns, tanto no Oriente quanto no Ocidente, também desejam deixar um legado para seu tempo e para as gerações futuras. Foi a partir disso que convidamos o público ocidental a contemplar os soldados de terracota sob a ótica da busca pela imortalidade, estabelecendo uma ligação concreta entre a civilização chinesa e a vida cotidiana dos americanos”, explicou Xu.
Ele também citou um exemplo do Museu de Arte Asiática de São Francisco: um recipiente ritual de bronze em forma de rinoceronte da dinastia Shang. Antigamente, a apresentação da peça se concentrava na descrição estética e na inscrição, relacionada a eventos históricos do final da dinastia Shang. No entanto, por estar situado próximo ao Vale do Silício, onde muitos visitantes atuam no setor de alta tecnologia, o museu passou a destacar os aspectos técnicos da fundição do bronze na época. Com isso, o público é apresentado a uma cultura desconhecida por meio de uma abordagem familiar, despertando interesse genuíno.
Xu observa ainda que, com os avanços das tecnologias digitais e da inteligência artificial, é possível contar histórias mais profundas e abrangentes, oferecendo ao público experiências mais ricas e imersivas.